Rio de Janeiro, 11 de abril de 2003.
Por Noemi Vieira.
“Olá Frederico,
Difícil
 falar sobre o seu livro sem me lembrar de grandes nomes da literatura 
como Hermann Hesse, Ítalo Calvino, Clarisse Lispector e, por que 
não dizer, Gustave Flaubert. Não que você os tenha lido e se apropriado 
de suas formas artísticas deliberadamente. Falo do tino metafísico que 
permeia a obra dos três primeiros e da obsessão estilística que 
persegue o último.
Parece-me
 que você usa a linguagem figurada para retratar o mundo físico (a 
matéria) – intenção que a priori torna-o paradoxal – como também o que 
há fora dele (metafísico). Ou seja, você conta a história de Aurora e 
Observador (personagens que possuem, inclusive, nomes muito 
significativos), sem deixar de sequenciar simultaneamente uma narração 
que permeia a subjetividade e o cosmos. (Será que a sua intenção 
foi essa mesmo?)
Questões
 que encontrei como a fugacidade do tempo e da aurora (no seu sentido 
semântico), a origem da vida, a efemeridade dos dias, a fluidez da 
matéria e a realidade dos sonhos denotam um ser inquieto com o mundo, 
inconformado com as estruturas e desiludido com a aparente solidez das 
coisas que nos rodeiam. 
Hesse
 procura a verdade na contemplação, Calvino persegue a precisão das 
significações, Clarisse dialoga com a origem, com o princípio, com o 
Deus e, por fim, Flaubert constrói sua trama nas teias da sinuosidade da
 sintaxe, das frases subordinadas, das descrições quase obsessivas do 
mundo à volta. Você é um pouco de tudo isso. Um mosaico de idéias e 
formas ainda não amadurecidas (ou, talvez, inovadoras), que nos traz uma
 inquietude cá dentro da alma, ora por sabermos intuitivamente do que se
 trata, ora por não sermos pacientes o suficiente para esmiuçarmos a 
significação primeira de seu texto, tão diluída num mar de minudências e
 reflexões.
Algumas
 coisas me fogem à cognição, como "a barra de metal" (que será?), o 
verdadeiro vínculo entre Aurora e Observador e, ainda, o menino com o 
qual ela se desculpa. Posso pensar que as três personagens formam uma 
família (se sua intenção também é contar uma história real), e também 
posso pensar não ser nada disso.Todavia, acredito que só com a 
continuação do livro seria possível mais clareza e objetividade. O 
desenrolar dos fatos me elucidaram dúvidas acerca do enredo, se é que se
 quer dar um sentido compreensível a história em si.
De
 qualquer forma, isso não o exime do talento nato. O "veio literário" já
 é fato constatado. Precisa ser lapidado, moldado, trabalhado, mas a 
essência reflexiva, tão imprescindível aos escritores, respira frenética
 dentro de você.
Continue
 o livro. Dê corpo a sua história e vida as suas personagens. Isso não 
só revelará um talento "enterrado" no mundo da Geofísica como fará bem 
ao seu "eu" de dentro.
Beijos,
Noemi.
Ps.
 Constatei algumas inadequações de concordância e regência, mas nada que 
comprometa o todo da obra nem diminua o valor de seu trabalho.”
 
 


