segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Maloqueiros do Mundo (I)

Quero deixar claro que este texto pode parecer politicamente incorreto. Vamos lá.

Eu, soteropolitano nato, nascido e criado na Cidade da Bahia, por muitos, e muitas vezes, tive minha naturalidade contestada.
- O quê? Você, bahiano? Não parece MESMO!
Dizem sem constrangimento. É certo que minha atual palidez não é típica de Soterópolis, ou mesmo quando era costumaz freqüentador da praia de Amaralina, nos meus saudosos tempos de Nordeste d'Aquela, também bahiano - diziam - não parecia. Emigrante de Salvador, vim morar no Rio e acabei atravessando as fronteiras nacionais.

Em Paris, tinha cara de marroquino - aliás, brasileiro tem a maior cara de marroquino - , mas acho que parecia mais bronco, talvez um típico latino-americano, não sei... enfim, e com certeza, um maloqueiro.

Os africanos árabes ou negros, os caucasianos do leste europeu, ciganos, indianos, afegãos, paquistaneses, chineses e turcos e povos semitas (exceto os judeus), descobri que são como eu, uns maloqueiros do mundo. Vejamos algumas histórias.


Ciganos I

Atravessava umas das pontes sobre o Rio Sena (falo do rio que corta Paris, não do bairro do subúrbio ferroviário de Salvador), salta aos olhos aquele objeto brilhante sobre a calçada de concreto. Distraído que vinha, continuei andando, mas minha expressão corporal não escondeu a surpresa. Do nada, aparece uma senhora apanhando o objeto, um pesado anel de ouro, que apanha o anel do chão, olha pra mim e diz algo como...
-Cest vous ? (Não sei francês, mas ela me perguntou se era meu, sem dúvida).
Respondi - non - e balancei a cabeça, também negando, e andando. Já com o anel na mão, ela falou umas coisas em francês, fez o inconfundível gesto com a mão me chamando e abriu o sorrizinho. Quando eu vi aquele dentinho encardido e um brilho na boca, pensei:
- Aaaaah, cigana...

A senhora cigana, como eu, é maloqueira do mundo.



Ciganos II

Chegando à igreja de Notre Dame de Paris, vários adolescentes se aproximaram. Como eu sou coração mole para ajudar o próximo, passei logo direto e me afastei, e Roberto ficou. Demorou um tempo e um segurança veio, todo grosso, enxotando a menina. O caso é o seguinte.

Os jovens ciganos ficam em frente aos museus, nas praças, até no aeroporto, abordando as pessoas e fazendo um gestual de que são surdas e estão arrecadando dinheiro. O curioso é que todos eles carregam uma pranchetinha e uma lista fotocopiada com o timbre de várias entidades e, no topo, da UNESCO, onde o desavisado assina o nome e assinala a quantia doada. Cheguei a ler doações de 10 a 20 euros. Vi algumas vezes esse grupo em conversa fonada entre si depois de enxotados por seguranças.

Eles têm um fenótipo bem diferente dos franceses, são bem morenos, cabelos escuros, sobrancelhas grossas. O fato é que Sarkozyputo com a Romênia, que resolveu dar passaporte europeu aos ciganos, e eles, cujo mais besta voa, tomaram o caminho da Europa. :-D

Os ciganos jovens de Paris, como eu, são maloqueiros do mundo.


O turco

Saio do hotel em Istambul, um turco, malandro, me pergunta as horas. Não que eu saiba turco, mas o gesto da pergunta é universal. No reflexo, respondo - seven ten - e prossigo a caminhada (malandragem). Foi aí que eu descobri tudo! Ele disse:
- Brazilian, really? You look like turkish!

Pura malandragem, mas prossigamos. Eu disse a ele o restaurante que estava indo e ele me aconselhou outro, que "custa menos da metade". Ele me apontou o restaurante e a rua onde a balada local pega. Eu o segui até o restaurante e ele me apontou um outro estabelecimento "pra tomar uma cerveja". Olhei da porta e havia só umas mulheres dançando e o tradicional "segurança". Entendi que o turco queria que eu entrasse no brega. Polidamente, disse-lhe
- This is not the place that I'm looking for. I'm going to the restaurant. Nice to meet you...
e entrei no restaurante onde comi um prato que nem vou tentar escrever o nome. E era comida, ao preço de 17 liras turcas, menos de 20 reais.

Assim, finalmente, descobri e subitamente compreendi que os turcos, que se parecem comigo, são também maloqueiros do mundo.

5 comentários:

Lisa Vietra disse...

E você ainda é maloqueiro nascido e criado em Salvador, Bahia. E isso tem sua magia, 'né não, véi?

Rossiter disse...

Concordo plenamente com tudo que escreve, principalmente com os muitos maloqueiros do mundo, que tambem já encontrei vários, em andanças por ai...
Mas nada se compara aos africanos, maloqueiros apaixonados pela maloqueiragem.

Unknown disse...

Oh Fred toma cuidado aí com esse turcos, viu?! Um amigo meu passou pela mesma situação q vc em Istambul, igualzinha!!! Só q ele, menos esperto, foi tomar cerveja com o turco, gastou o q tinha e o q não tinha, sem saber, e ainda quase apanhou do segurança...

Fafo disse...

Pode ficar tranqüila, Elita. E obrigado pelo cuidado, mas é que "aqui, é muntios ano de malandrage, é muntia bagage. Eu só vô nar manha...". :-)
Beijos.

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.