terça-feira, 14 de abril de 2009

Sobre Tipos de Pessoas, Pessoas Próprias e Pessoas Alheias a Outras

As pessoas são diferentes. Há vários tipos de pessoas e cada uma se afina mais com uma coisa do que com outras. Trivialidades à parte, isso acontece harmoniosamente e estabelece a completude do mundo.


Além de diferentes, as pessoas não são únicas. Uma personalidade encontra existência em mais de uma pessoa, sendo que as de cardinalidade maior do que um constituem-se naquelas outras expressões da primeira personalidade. Para exemplificar, imagine-se que uma pessoa compreenda sua própria existência como única; pois, para ela, há, inexoravelmente, pelo menos mais uma que expressa a mesma personalidade, ainda que não primariamente. Trata-se pois duma segunda cardinalidade duma personalidade ou, simplesmente, duma outra pessoa que é a primeira.


Assim, pode-se enunciar formalmente o fato como se segue. Seja você e sua personalidade primária, a qual, por definição, tem cardinalidade igual a 1. Há pelo menos mais uma pessoa com a mesma personalidade, cuja menor cardinalidade é 2. De maneira mais simples, pode-se dizer que outra pessoa pode ser você. Isso, inclusive, admite o caso particular de a "sua" personalidade ser mais original na outra pessoa do que em si próprio. Mas, como eu disse, trata-se dum caso particular. O mais interessante dessas outras pessoas que são você é que a sua personalidade nelas independe completamente da mesma em si próprio, o que confere multiplicidade a uma mesma personalidade. Não se trata pois de repetição, replicação, muito menos reprodução ou imitação, mas sim de multiplicidade de uma mesma existência. Disso, precisamente, decorre a existência de tipos singulares de pessoas diferentes.


Como eu disse no início, as pessoas são não só diferentes, mas de "tipos" diferentes. Muito bem: num mundo de uma imensidão branca, um dia uma garotinha passeava com sua mãe, com quem conversava loquazmente. Ao ver a diversidade de pessoas na rua, comentou: - As pessoas são muito diferentes, né, mamãe... - ao quê a mão respondeu desinteressadamente - É, minha filha. Prosseguiram, até a menina exclamar:
- Veja, mamãe! uma pessoa que só é olho: uma pessoa visual!!!
- Um oculantropo, minha filha - corrigiu a mãe. Prosseguindo, explicou -A pessoa que só é olho é um tipo tal que só é um olho, cujo pensamento é seu próprio olhar, seu "ver o mundo" encerra sua existência e pensar próprios. Ainda caminhando, a garotinha prosseguiu:
- Veja, mamãe! uma pessoa que só é nariz, uma pessoa nasal!
- Um rinantropo, filhinha - corrigiu-a mais uma vez a mãe e tornou a explicá-la - que é aquela que não é outra coisa senão somente um nariz e nada mais. A pessoa do tipo que é somente nariz simplesmente respira e inala os odores do mundo para se comunicar.
E mais adiante,
- Veja, mamãe, uma pessoa que só é orelha, uma pessoa auditiva!
- É um auriculantropo - corrigia, já dando sinais de impaciência.
- Veja, mamãe, uma pessoa que só é casa! como se chama uma pessoa que só é casa, mamãe?
A mãe se surpreende com o fato, o que lhe dá um pouco mais de motivação para seguir com a conversa. Sem responder à pergunta da menina, ela, contudo, alimenta o diálogo:
- Uma pessoa que só é casa é um tipo de pessoa que é uma casa flutuante no ar na forma da consciência de uma pessoa -, o que a menina não entende imediatamente. E, antes que tentasse prosseguir, a menina surpreende-se ainda mais com o que vê, exclamendo quase histericamente.
- Veja, mamãe, uma pessoa que é uma cadeira! - e não consegue dizer mais nada, catatônica diante da pessoa que só é uma cadeira.


Uma núvem de lúmenes envolve a criança que se transforma instantaneamente num suco de laranja e sai flutuanto pela praia de Copacabana rumo ao infinito. A pessoa que só é cadeira se transforma na menina, para alegria da mãe, que nem pudera afligir-se pela rapidez dos acontecimentos. Com sua filha de volta, a mãe volta a seu estado de paz, concluindo que a cadeira é a outra pessoa que é sua filha, e o suco de laranja é outra pessoa na forma circunstancial da sua filha, numa personalidade de cardinalidade ainda maior do que 2.

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